sexta-feira, 5 de julho de 2019

Quadrinhos Disney, Culturama e A Saga do Tio Patinhas



Tive ótimos momentos na infância lendo e relendo os mesmos almanaques surrados Disney existentes em minha casa e na casa de minha finada avô. Sempre encontrei bastante alegria com aquelas histórias em mãos. Ainda hoje, tento resgatar um pouco daquela sensação de esvaziamento momentâneo das preocupações diárias e, por isso, esta semana reli A Saga do Tio Patinhas. Sorte a nossa que, antes de encerrar a maioria das publicações, a Editora Abril nos deu esse encadernado, pois a arte de Don Rosa não é bem usufruída no formatinho em papel jornal e impressão vagabunda.

Aproveitei e reli a história Uma Carta de Casa, presente no Mega Disney n.° 01. Acredito que este conto deveria constar no encadernado capa dura. De certa forma, lhe complementa e reforça a construção da personalidade do pato avarento como desenvolvida por Don Rosa. Na trama, Patinhas retorna ao castelo da família e, em dado momento, reflete acerca de sua jornada em busca de fortuna e aventuras, diante dos túmulos dos pais:
"Vocês aprovam minha missão de vida? Estão orgulhosos por eu viajar pelo mundo em busca de riquezas? Entendem minha paixão por aventura? Ou a emoção que sinto ao desafiar a inteligência e perspicácia dos melhores e vencer? Ou acham que só ligo pro dinheiro? O que pensam? Nunca saberei! Estive sempre ausente e não recebia muitas cartas de meus pais!".
Não apenas fiquei grato por reler algo assim como, igualmente, por me deparar com a retomada da publicação dos quadrinhos Disney no Brasil, agora pela Culturama Editora. Torço para que vinguem e continuem agradando a velhos e fiéis leitores e, com sorte, conquistem novos: segunda parte esta que acho meio difícil, embora espero estar enganado.

A Editora Abril deteve o monopólio disneyano brasileiro durante mais de seis décadas. Aliás, sua primeira publicação foi justamente Pato Donald. Alguns colecionadores ficaram de muxoxo quando veio o anúncio do cancelamento da antiga parceria. Dá pena, deveras. Contudo, convenhamos: nenhuma grande editora deu a mínima para leitores de HQs. Recordo bem do descaso conosco: formatinhos vagabundos, cheios de propagandas de tênis, chocolate, biscoito e papelaria, a preços não tão acessíveis para a maioria. Era um setor sempre saudável, com boas vendas. Muitos editores sempre destacam que o setor de quadrinhos da Abril e da Globo, por exemplo, não fechava o ano no vermelho. Contudo, as empresas preferiam cobrir buracos de outras publicações mais "maduras", de nichos específicos, com o lucro dos quadrinhos. Nas bancas, víamos revistas grandes, bem impressas e com papel de qualidade para todos os gostos, muitas vezes só dando prejuízo, cercadas de zelo e carinho dos publishers, dos magnatas e de seus amiguinhos. E os gibis? Continuavam rendendo grana a rodo e sem nenhuma atenção. Éramos trouxas com duas opções: comprar ou não ler nada. Isso mudou aos poucos, já em meus anos de vida adulta, com a chegada de concorrência. Só que foi tarde. Não dava mais para a Abril acompanhar. E, meus caros, tanto faz. Certamente nenhum membro das famílias Civita ou Marinho estão no perrengue, deixando de viver suas lautas vidas.

Um dado oficial curioso encontramos na Graphic Disney n.° 2 Ducktales - O Filme - O Tesouro da Lâmpada Perdida. Nas segunda e terceira capas, há matéria acerca das publicações nacionais disneyanas. De acordo com a própria editora, em 1990 havia trinta e seis diferentes publicações de HQs "imbatíveis campeãs de vendas". Ainda de acordo com o editorial, "Em 1990, foram lançadas também 10 revistas de passatempos e atividades, além de 5 coleções de livros e fascículos infantis, totalizando, então, vendas superiores a 25 milhões de exemplares por ano". É gibi pra burro sendo vendido para o então público consumidor acostumado a só adquirir lixo mal impresso nas bancas de suas cidades.

Não há aquela velha expressão "O pato paga a conta"? Pois é. Isso serviu durante anos para a Editora Abril. É sabido que em tempos remotos o próprio Victor Civita costumava tranquilizar parceiros e colaboradores em novos e arriscados projetos possíveis causadores de prejuízo afirmando "O Pato paga", em alusão as boas vendagens das revistas Disney e linha infantil em geral. Essa ideia permaneceu durante tempos no âmbito editorial, para alegria de grupelhos e suas publicações destinadas ao público maduro, arrojado e inteligentinho e para o desgosto de leitores dos mal vistos gibizinhos pueris.

Até recentemente a falta de respeito com leitores era tamanha que blogueiros não tinham acesso a capas e a algumas imagens em alta resolução para indicar ou comentar algo. Só os blogues "amigos do editor" recebiam este material e tacavam ali sua marca d'água. Isso vale para editoras de revistas, HQs e livros. Se os caras se fecham numa panelinha, okay. Pois então sobrevivam dentro deste mesmo grupelho. Trouxa é o blogue ou vlogue que, a troco de nada, ainda pratica publicidade ostensiva regular para editoras. No meu antigo site, havia empresa cara de pau enviando, por e-mail, todos os meses, press release de material seu, muitas vezes que nem me interessava e que jamais solicitei, para que eu divulgasse em meu espaço. E não fazia o obséquio nem de anexar algumas imagens de qualidade superior. Ah, vá...

Repito: torço para que a Culturama obtenha sucesso neste novo afã. Entretanto, se não, não chorarei as pitangas. Há "toneladas" de arquivos digitais grátis para quem quiser ler. E ninguém conseguiria ler tudo. Além disso, sebos ainda guardam muito papel impresso para aquisição. Bola pra frente.

Achei bacanas as caixas com os cinco títulos Disney: Mickey, Tio Patinhas, Pato Donald, Pateta e Aventuras Disney, com capa em couché e miolo em offset em ótima impressão. De brinde ainda vem cartela com adesivos, aquele tipo de mimo inútil mas que agrada a colecionadores. O box em si é bem rígido e bonito. Eu mesmo comprei o n.° "0" e dos números primeiro ao terceiro. Acho que farão kits assim até o quinto número. Ao final, no expediente, consta a numeração que seria se a publicações ainda fossem da Abril, demonstrando atenção com colecionadores antigos. Mas, francamente, penso que o sistema de HQs mensais, ainda mais formatinhos, não vinga. Por melhor que seja a distribuição da editora em diversos espaços, o tempo de exposição de material assim é curto e, convenhamos, pouca gente efetivamente acompanha, de forma religiosa, publicações assim. Podem espernear à vontade, mas nossa época é de encadernados. Mensais já eram.

É isso. Abraços e cuidem de seu rico dinheirinho.

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7 comentários:

  1. "A Saga do Tio Patinhas" - essa edição marca a fase final da Abril com a Disney no Brasil, tenho uma na estante e é bem bonita.

    curiosamente, hoje esses encadernados podem ser encontrados pela metade do preço de lançamento no Mercado Livre

    abs!

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    1. Vejo alguns quiosques de shopping com essas edições e uns pacotinhos padronizados com formatinhos Disney por preços bem acessíveis.
      Quando lançaram, pensei q esse encadernado esgotaria.

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  2. Uma pena essa historia não ter sido incluída no encadernado. Vou procurar em scan para conferir. Lamentei bastante a derrocada da Abril, mas por questões bem menos altruístas: as coleções do Barks e do Rosa inacabadas e a promessa de uma coleção do Paul Murry. Abraços!

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    1. "as coleções do Barks e do Rosa inacabadas e a promessa de uma coleção do Paul Murry"

      São coleções, que, creio, eu faria, mesmo querendo deixar de comprar mais muitos livros impressos. Assim, compreendo bem sua frustração...

      Abraços!

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  3. Fiquei extremamente infeliz com a incompletude da coleção do Barks. A do Don Rosa já havia começado antes pela Fantagraphics, antes da Abril se meter a fazer encadernados capa dura a torto e a direito, depois do sucesso de vendas que foi A Saga.

    A primeira vez que li Uma Carta de Casa foi na mensal do Tio Patinhas, meados de 2004. Primeira vez também que lia algo do Don Rosa, e impacta demais, até hoje, pela profundidade do roteiro e do cuidado no traço e nas gags em segundo plano nos quadros. Merecia uma publicação de vergonha, pelo menos em papel bom (infelizmente nem mesmo a Saga foi tratada com cuidado, vide alguns quadros mal impressos na edição capa dura).

    A última história que Rosa desenhou, a Prisioneira do Vale da Agonia Branca, esta talvez seja a segunda história mais bela que ele fez. Só a li uma vez, mas nunca me esqueço da cena em que Dora e Tio ficam na cabana.

    Poxa vida, vou comentando e me lembrando de outras histórias. Tem uma do Marco Rota que tem a participação da Dora Cintilante também, relaciona com essa época do klondike... meu pensamento é de que é sensa a história, mas não lembro nem do plot principal hahaha. Vou procurar e comento aqui depois. Vale conferir.

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    1. Bruno, me perdoe por não responder antes. É que vi apenas HOJE este comentário e gosto sempre de responder às pessoas. Foi algum desleixo meu ou então o Blogger não me notificou de seu comentário.

      Você é um antigo e grande leitor Disney. Seu relato é apaixonado. Prisioneira do Vale da Agonia Branca é realmente uma belíssima história e fico grato a Abril pelo encadernado de A Saga, mesmo, deveras, possuindo esses problemas mencionados por vc. Os HCs da Abril, perto do final, é que atingiram uma melhor qualidade gráfica.

      Abraços e seja sempre bem vindo!

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