sábado, 31 de agosto de 2019

Nosso Homem em Havana [ e outras obras sobre mistério e arapongagem ]



Tenho uma ideia de que todo serviço de inteligência que cresce demasiadamente torna-se obsoleto. Núcleos não oficiais começam a surgir em sua gestão, linhas de comandos se perdem ou são subvertidas. Talvez essa hipótese explique porque pequenos serviços de inteligência ao redor do globo é que realmente conquistam respeito, a exemplo das agências de Israel e da Jordânia. Dizem que a Agência Brasileira de Inteligência criada por Fernando Henrique é uma das maiores do mundo, mas que não serviria para nada, por exemplo. Vai-se saber...

Numa coisa acredito: a maioria dos serviços de inteligência, hoje, não sabem de onde vieram nem aonde irão, tampouco o que fazer de efetivo além de analisar informações abertas que talvez signifiquem algo ou, talvez, não. E assim vão tocando o cotidiano burocrático, com seus funcionários preocupados em bater o ponto religiosamente do trampo e, assim, pagar o pão e o leite de cada dia. 

Não me interesso tanto pelo tema espionagem. Os poucos livros que me caem em mãos são lidos com certo interesse. Mas me vêm bem ao acaso. Não cato obras com esse tema. Prefiro mesmo outros gêneros. Esses dias, limpando as estantes, reservei uns títulos onde o jogo de informação e contra-informação dá o mote à trama. São obras que indico por serem divertidas. Estão nas imagens acima. Destaco que Os Espiões de Veríssimo aborda, na verdade, um grupo de amigos que se unem em torno de escritos de uma garota desconhecida e empreendem ação particular para salvá-la. De qualquer forma, há o jogo de xeretamento no mote, e por isso incluo-o na presente lista. Ainda sobre Veríssimo, indico bastante O Opositor. Conquanto seja uma narrativa curta e realizada por encomenda para a série Cinco Dedos de Prosa, o autor foi bem sucedido ao abordar algo verdadeiro: a realidade social, política e cultural não é tão simplória como a maioria acredita.

De todos, o que mais acho interessante pelo viés de pura espionagem é Nosso Homem em Havana, escrito pelo espião britânico Graham Greene. A história se passa na pré-revolução cubana. Mas esta, em si, não é relevante. Em momento algum o autor aborda os aspectos políticos e sociais que levarão à tomada do poder por Fidel Castro e suas tropas terroristas. O foco é no inglês Jim Wormold, vendedor de aspiradores de pó que rala para sustentar sua filha adolescente, sempre cortejada pelo temido capitão Segura. Um certo dia, Jim Wormold é abordado pelo espião britânico Hawthorne para que forneça informações à Inteligência inglesa acerca da conjuntura política cubana. Mas Jim Wormold nada tem a oferecer, só que passa a inventar mentiras como forma de, assim, obter dinheiro da Coroa. Contudo, suas invenções coincidentemente encontram respaldo em acontecimentos recentes, como se se tornassem realidade.

O que se destaca em Nosso Homem em Havana é algo claramente desenvolvido por Umberto Eco em O Pêndulo de Foucault: na paranoia, no caos semiótico onde espiões e meros xeretas brincalhões atuam, mentiras podem se tornar verdades anteriores ao nascimento da própria mentira. Assim, não raro, conspiradores são engolidos por suas conspirações. Isso é melhor destrinchado em O Pêndulo de Foucault, embora permeie outras obras de Eco, a exemplo de Baudolino.

Resumindo: recomendo todos os livros aqui arrolados. Serviram para dar aquele abalo saudável aos miolos às vezes enferrujados. E, às vezes, para desopilar com as loucas aventuras de um investigador brasileiro subnutrido, por que não um pouco de Ed Mort?, tanto em prosa quanto em HQ, algo que sempre recomendo. 
  • O homem que matou Gelúlio Vargas - Jô Soares
  • A Companhia - Robert Littell
  • O Pêndulo de Foucault e Baudolino - Umberto Eco
  • Os Espiões e O Opositor - Luís Fernando Veríssimo
  • Nosso homem em Havana - Graham Greene
  • O espião que sabia demais e O espião que saiu do frio - John le Carré

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