segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

O Velho e O Mar, de Ernest Hemingway [ Romance, Resenha ]



Em fevereiro de 1988, Paulo Coelho estava em frente à folha em branco tentando escrever um livro. Não saía nada. Foi dar uma volta no calçadão em Capacabana para arejar as ideias. Retornou ao seu apartamento e, em frente à máquina, recordou de O Velho e O Mar, de Ernest Hemingway. O nome do protagonista deste romance é Santiago. E Paulo Coelho escreveu a primeira frase de seu trabalho mais famoso, O Alquimista, da seguinte forma: "O rapaz chamava-se Santiago.". Não conheço muito do trabalho de Paulo Coelho. Mas penso que quem escreve um livro tão simples e bonito como O Alquimista pode morrer em paz com a humanidade. É um romance perfeito, sem enrolação e rebuscamentos desnecessários e repleto de belas passagens que - se não nos fazem refletir profundamente - ao menos nos dão aquela sensação de conforto, por estar lendo algo tão agradável. Fiquei feliz com o ingresso do "mago" na Academia Brasileira de Letras (afinal, ali há muita gente que nunca contribuiu à literatura nacional). Num cenário internacional repleto de "Stephenies Meyers", desejo é vida longa à carreira de um autor de melhor qualidade que, além tudo, é brasileiro.

Comecei citando Paulo Coelho para falar um pouco da novela que o inspirou: O Velho e O Mar, uma obra também tão simples e que, justamente por isso, tocou milhões de leitores ao redor do Planeta e foi, inclusive, citada pela Academia Sueca quando laureou Hemingway com o Nobel de Literatura em 1954. Houve uma época em que o Nobel de Literatura foi sério e premiava, realmente, pessoas que se dedicavam à.... Literatura. Atualmente, tornou-se uma premiação obscura e quase extensão de outro Nobel - o da Paz. A narrativa também rendeu ao escritor o Pulitzer de 1953.

Spoilers. Na história com pouco mais de cem páginas, Santiago vai sozinho pescar, muito distante da costa. Há oitenta e quatro dias está com azar, não conseguindo fisgar nada a não ser pequenos peixes que servem tão somente de isca. Por essa sua má fase, a família do garoto Manolin (seu ajudante desde os cinco anos de idade e melhor amigo), proíbem este de continuar servindo ao velho. E justamente neste dia em que pesca sozinho, enfrenta o maior peixe de sua vida: um espadarte gigante e igualmente esperto, em matéria de sobrevivência. Durante mais de dois dias, os dois lutam para ver quem sucumbirá primeiro. Santiago está cansado e a idade avançada torna tudo mais difícil. A linha de pesca grossa corta-lhe as mãos várias vezes. A única comida a bordo são pequenos peixes conseguidos na hora, comidos crus. É impossível dormir bem na embarcação pequena, enquanto não pode soltar a linha, sob hipótese alguma. O velho ama o mar - que sempre lhe sustentou -, assim como ama e admira aquele peixe majestoso. Mas precisa vencê-lo, matando-o e levando-o ao mercado de Havanna e, com isso, conseguindo sustentar-se por mais uns dias e ganhando, novamente, o respeito da vila onde vive.

Adorei esse livro por sua simplicidade e leitura acessível. Há bons "ensinamentos" sobre maneiras de encarar a vida, companheirismo (a bonita relação entre Manolin e Santiago) e, claro, a superação humana. Mas você não precisa catar essas "lições". Basta o bom entretenimento que a leitura lhe proporcionará. O que achei mais instigante foi a relação entre o pescador e sua pesca - a admiração que se tem pelo animal a ser abatido, esse paradoxo entre graça e sobrevivência. No meio do romance, nos deparamos com citações que ilustram esse sentimento antagônico, como:
Virgem bendita, rogai pela morte daquele peixe, embora ele seja tão belo.
"Mas tenho de matá-lo", murmurou o velho. "Em toda a sua grandeza e glória. Embora seja injusto. Mas vou mostrar-lhe o que um homem pode fazer e o que é capaz de aguentar. Eu disse ao garoto que era um velho muito estranho. Agora chegou a hora de prová-lo."
Ao final do romance, já com o imenso peixe-espada preso à lateral do pequeno barco sem motor, Santiago precisa evitar que os tubarões, atraídos pelo sangue, ataquem. Como não podia martelar a cabeça do peixe, foi preciso utilizar arpão no abate, espalhando sangue até o retorno à costa. Mas o velho não obtêm êxito e, embora regresse bem, a pesca não tem salvação: amarrada ao barco, de proa à popa, há somente o esqueleto do que foi um belo animal. O peixe perdeu; Santiago, também. Mas ele quer apenas descansar antes de, novamente, sair ao mar com Manolin, para, mais um vez, tentar a sorte. Não deixa de ser uma boa parábola. E a lição é esta: viver. Entretanto, no "faça o que digo, não faça o que faço", Ernest Hemingway - sofrendo com a diabetes e falta de memória progressiva, além da depressão - atirou contra a própria cabeça em julho de 1961.

Minha edição é 66ª da Bertrand Brasil, traduzida por Fernando de Castro Ferro, com ilustração de C.F. Tunnicliffe e Raymond Sheppard. A capa é cartonada com orelhas. São 130 páginas e custa de R$ 20,00 a R$ 34,00.

O Velho e O Mar foi brilhantemente adaptado para o cinema pelo artista russo Aleksandr Petrov, lhe garantindo o Oscar em 2000 de melhor curta animação. Com menos de vinte minutos de duração, essa empreitada levou mais de dois anos para ser concluída. Tratam-se de vinte e nove mil quadros pintados a óleo e posteriormente fotografados. Abaixo, a íntegra desse trabalho. E, a seguir, imagens dos livros mencionados nesta postagem.




4 comentários:

  1. Li O Velho e o Mar quando menino por insistente recomendação de meu pai. Me lembro da enorme frustração ao "ver" o peixe comido por tubarões depois de tanto trabalho. Mas afinal, o velho venceu, não importa o resultado. Linda animação! Obrigado!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. É como a história da prova dos nove em matemática. O cara pensa: porra, isso tudo para dar zero? Aí no romance, vc se deprime: porra, tudo isso pra se foder no final?
      Mas, como gosto de dizer, assim é a vida, Charlie Brown!
      Abraços, grande Pateta!

      Excluir

Comente ou bosteje.